1830
LEGISLAÇÃO E CRIMES NO IMPÉRIO

RASGANDO O CÓDIGO CRIMINAL, INTERPRETAÇÃO DO CÓDIGO PENAL PELO OLHAR DE FÊNIX VALENTIM (12 ANOS)

GALERIA DOS CONDENADOS JOSÉ GOMES DA CRUZ, BIBLIOTECA NACIONAL
O Código Criminal de 1830 foi uma das principais produções no processo de consolidação do Brasil independente. Diferentemente da Constituição, que mencionou a escravidão apenas de forma indireta, o Código Criminal abordou explicitamente a instituição do cativeiro. Pessoas escravizadas foram consideradas sujeitos ao poder doméstico de escravistas, sendo juridicamente incapacitadas de mover ações por si mesmos e necessitando de representantes legais, os curadores, tal como mulheres e crianças.
Na seção sobre crimes, pessoas escravizadas eram identificadas como sujeitos do delito de insurreição, definido como a tentativa de obter liberdade pela força (artigos 113, 114, 115). As penas previstas incluíam açoites, galés ou pena de morte, independentemente de a liderança insurgente ser livre, liberta ou escravizada. Além disso, o artigo 179 criminalizava a “redução à escravidão de uma pessoa livre”, refletindo a constante ameaça de reescravização que gente negra livre e liberta enfrentava. Essa lei visava proteger contra prisões arbitrárias de pessoas negras livres, frequentemente colocadas em suspeição de serem escravizados fugidos.
Resistências Radicais
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BANDA DE LETRA - A CAPOEIRA, OS CAPOEIRISTAS E A GINGA PRA DRIBLAR A OPRESSÃO

MULHER CAPOEIRA” ILUSTRAÇÃO DE HERBERT REIS
A capoeira e seus praticantes tornaram-se alvos frequentes das investidas policiais, sendo associados à criminalidade. As abordagens violentas e prisões de grupos de homens negros aumentaram nos anos finais da escravidão, com a intensificação da campanha abolicionista. O jornal O Paiz relatou como, apesar das repressões policiais, os capoeiristas continuavam suas atividades nas ruas da Corte:
“Decididamente as quadrilhas de capoeiras tiveram nestes últimos tempos incentivo para ostentar os seus combates nas ruas mais frequentadas da cidade. Tal franqueza mostra nessas lutas sangrentas, que são escândalos da cidade, que de certo contam com valiosas proteções contra a autoridade.
Raro é o dia em que a polícia não prenda e recolha à detenção muitos desses desordeiros, e, apesar disso eles voltam a repetir as tropelias para de novo serem presos e soltos. Nesse círculo vicioso debate-se há muito a autoridade policial, impotente pelos costumes a reprimir essas desordens, de que muitas vezes são instigadores os seus próprios agentes, quando não são os heróis.
E o poder público ainda não achou a oportunidade de reprimir com os meios legais de que dispõe, ou com as medidas legislativas que forem necessárias, esse estado de guerra à sociedade e à civilização fluminense.
Anteontem, na freguesia do Sacramento, na de Santana e na do Espírito Santo foram presos em flagrante mais de seis capoeiras.
Quase todos estavam armados de navalhas, cacetes e outras armas [de] defesas.
Há lei que os pune por tal, mas infelizmente as probabilidades são todas pela impunidade. O patronato, o empenho os farão sair ilesos da cadeia e voltar a novas empresas” (Noticiário…, 1885, p. 2).
FONTE:
NOTICIÁRIO. O Paiz, Rio de Janeiro, n. 78, p. 2, 20 mar. 1885.
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PINTO, Ana Flávia Magalhães. Escritos de liberdade: literatos negros, racismo e cidadania no Brasil oitocentista. Campinas, SP: Editora da Unicamp, 2018, cap. 6, p. 232-233.
REBOUÇAS, André. Diário, 15 de maio de 1869. Acervo da Fundação Joaquim Nabuco.

NOTICIÁRIO. O Paiz, Rio de Janeiro, n. 78, p. 2, 20 mar. 1885.

BRASIL. Código criminal do Império do Brasil: Parte primeira: dos crimes e das penas. Rio de Janeiro: Tipografia Nacional, 1831.

FERREIRA, Ricardo Alexandre. Um julgamento, duas penas: livres e escravos nas leis e nos tribunais. In: FERREIRA, R. A. Crimes em comum: escravidão e liberdade sob a pena do Estado imperial brasileiro (1830-1888). São Paulo: Editora Unesp, 2011, cap. 3, p. 155-192.
NEQUETE, Lenine. O escravo na jurisprudência brasileira: magistratura e ideologia no segundo reinado. Porto Alegre: Revista dos Tribunais, 1988.

WESTIN, Ricardo. 1º Código Penal do Brasil fixou punições distintas para livres e escravos. Agência Senado: Rio de Janeiro, 4 dez. 2020.
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