1851
REGISTROS E LIBERDADE PRECÁRIA

Aspecto do decreto nº 797, de 18 de junho de 1851, que estabeleceu o regulamento do recenseamento geral de 1852.
Em 1851, os Decretos nº 797 e nº 798, conhecidos como a “Lei do Cativeiro”, tornaram obrigatórios o registro de nascimentos e óbitos, além de determinarem a realização de um censo geral do Império. Essas medidas foram recebidas com desconfiança pela população negra, que, conhecedora dos abusos da sociedade escravista, temeu que a coleta de dados fosse uma estratégia de mapeamento de pessoas para a promoção de reescravização, especialmente após o fim do tráfico de africanos em 1850. Os registros segregavam a população em três categorias distintas: escravizados, livres e libertos – o que aumentou o receio entre pessoas negras livres e libertas.
Essas medidas geraram uma onda de levantes populares, alimentados pelos boatos de que os registros tinham como propósito “escravizar a gente de cor”, conforme analisado por Sidney Chalhoub em A Força da Escravidão (2012). Examinando documentos da época, Chalhoub evidencia que o temor cotidiano da população negra livre de ser forçada novamente à escravidão não era infundado. Embora reconhecido no Código Criminal do Império, o ato de reduzir gente livre à escravidão no Brasil foi muito praticado. Este episódio aponta, portanto, a precariedade da liberdade de gente negra no Brasil do século XIX, particularmente aquelas pessoas mais vulneráveis, cuja condição de liberdade era como constantemente ameaçada e instável, gerando reações intensas e desafiadoras contra as autoridades imperiais.
TEXTO ADAPTADO PELO EDITOR REVISOR
FONTE: Chalhoub, Sidney. A Força da Escravidão: ilegalidade e costume no Brasil oitocentista. São Paulo: Companhia das Letras, 2012.
Resistências Radicais
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O IMPÉRIO DAS SUSPEIÇÕES
Casos de injustiça e abuso contra mulheres e homens libertos eram frequentes e amplamente documentados, como revelam diversas denúncias publicadas nos jornais do século XIX. Os relatos a seguir exemplificam o cotidiano marcado pela insegurança e pela constante ameaça de violação dos direitos de gente negra livre, apontando até mesmo para os limites da cidadania no Brasil.
O jornal Correio Mercantil de 9 de outubro de 1859 noticiou que em 8 de outubro de 1859, a Secretaria da Polícia da Corte notificou a presença de uma menor, Joaquina, de 12 anos, que alegava ser liberta, na freguesia do Engenho Velho. [Texto adequado pelo editor revisor]
O Correio Mercantil de 3 de julho de 1866 relatou que, naquele mesmo dia, Carolina, uma mulher preta que se afirmava liberta, foi presa por suspeita de ser escravizada e fugida enquanto andava pelas ruas. [Texto adequado pelo editor revisor]
No O Paiz de 10 de novembro de 1886 um caso relatado em 9 de novembro de 1886, no Rio de Janeiro, por Manoel Pinto para o ministro da Justiça, mostra a prisão de Leandra, uma mulher liberta, pela subdelegacia da Glória a pedido do escravista que a teve sob sua posse. Mesmo após a apresentação do alvará de liberdade, tanto Leandra quanto o defensor que apresentou o alvará foram detidos temporariamente. Este episódio exemplifica o abuso de poder e a tentativa de anular a liberdade conquistada por Leandra. [Texto adequado pelo editor revisor]
Esses relatos ilustram como a experiência da liberdade para libertos era marcada pela constante ameaça de reescravização e pelo abuso de autoridade.
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CHALHOUB, Sidney. Visões da Liberdade: uma história das últimas décadas da escravidão na Corte. São Paulo: Companhia das Letras, 1990.

OLIVEIRA, Maria Luiza Ferreira de. Sobreviver à pressão escapando ao controle: embates em torno da "lei do cativeiro" (a Guerra dos Marimbondos em Pernambuco, 1851-1852). Almanack Braziliense, São Paulo, n. 3 , maio 2006.

ROSSI, Amanda. A desconhecida revolta popular armada que barrou o primeiro censo no Brasil, em 1852. BBC News Brasil, São Paulo, 2 jun. 2019.

SAVERDA, Renata. POPULAÇÃO, RECENSEAMENTO E CONFLITO NO BRASIL IMPERIAL: o caso da ‘Guerra dos Marimbondos’. Dissertação (Mestre em História) – Programa de Pós-Graduação em História, Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 2011.
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