1886
"REGULAMENTO NEGRO"
DECRETO Nº 9.602, DE 12 DE JUNHO DE 1886

CÓDIGO DE ESCRAVIDÃO DO DISTRITO DE COLUMBIA, 1862, BIBLIOTECA DO CONGRESSO
O Decreto nº 9.602, de 12 de junho de 1886, conhecido como "regulamento negro" no Brasil, fez referência ao Code Noir, dos territórios franceses na América, e aos Slave Codes, dos Estados Unidos. Essas legislações endureceram as relações dentro da escravidão, estabelecendo crimes, penas e condutas.
O decreto de 12 de junho de 1886 estabelecia em seu artigo 15º que "incorre no crime do art. 260 do Código Penal [isto é, no crime de furto] aquele:
a) que receber em casa, estabelecimento, serviço ou obra, ou ocultar escravo alheio, sabendo que o é, s[e] dentro de 15 dias depois de recebido não manifestar ao Juiz de Paz do distrito ou Inspector de quarteirão;
b) que conservar na casa, estabelecimento, serviço ou obra, ou ocultar escravo, depois de conhecer a sua condição, e não o manifestar no prazo legal, contado da nova ciência."
Essa medida visava intimidar as cooperações abolicionistas com os escravizados que optavam pela fuga.
Além disso, o "regulamento negro" brasileiro, em seu Art. 2º, previa que o escravizado seria liberto caso o escravista que tivesse legalmente sua posse, mudasse de domicílio para outra província ou o transferisse forçadamente. No entanto, o decreto acrescentava um adendo importante: o Município Neutro, correspondente à cidade do Rio de Janeiro, passaria a fazer parte da Província do Rio de Janeiro.
Isso implicava que uma mudança para o Município Neutro não seria considerada transferência de província, permitindo que escravistas mantivessem escravizados sob seu controle ao se deslocarem para o centro político e econômico do Império. Essa manobra, segundo Rita de Cássia Vasconcelos (2011), aumentava o comércio ilegal interno de escravizados entre o Município Neutro e a província, dificultando as possibilidades de liberdade e favorecendo os interesses escravocratas.
Abolicionistas como José do Patrocínio criticaram veementemente essa política, pois viam nela um retrocesso, ao reforçar a continuidade do regime escravocrata sob uma aparência de regulamentação legal.
FONTE:
VASCONCELOS, Rita de Cássia Azevedo Ferreira de. República sim, escravidão não: o republicanismo de José do Patrocínio e sua vivência na República. 2011. 214 f. Dissertação (Mestrado em História) – Instituto de Ciências Humanas e Filosofia, Universidade Federal Fluminense, Niterói, 2011.
Resistências Radicais
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QUILOMBOS ABOLICIONISTAS

TRABALHADORES NEGROS EM ATIVIDADES DE EMBALAGEM E PESAGEM
Com a massiva adesão dos escravizados, essa nova etapa de atuação contou com a criação de quilombos abolicionistas espalhados pelo país. Com características próprias, mas não menos aguerrido que outros modelos de quilombos, esses novos espaços contemplavam tipos específicos de liderança e estratégia.
Funcionavam, como bem argumenta Eduardo Silva (2003), como uma espécie de instância de intermediação entre a comunidade de fugitivos e a sociedade envolvente. O quilombo provavelmente mais conhecido à época foi o Quilombo do Leblon, onde seu líder, Seixas, cultivava suas famosas camélias, símbolo do movimento. Seixas era, também, uma espécie de "procurador" da Confederação Abolicionista, um dos órgãos responsáveis pelo financiamento desses lugares de resistência.
Podemos dizer que o jornal Gazeta da Tarde, de José do Patrocínio, era o órgão oficial da Confederação Abolicionista e que, por detrás dos panos, ajudava a organizar e a manter o Quilombo do Leblon. Já em sua primeira prestação de contas anual (1883-1884), o tesoureiro da Confederação, André Rebouças, incluiu entre as principais despesas da instituição nada menos que 2:612$280, sob a estranha e evasiva rubrica de "auxílios a escravizados em certas e determinadas condições" (Silva, 2003, p. 18).
Fruto de uma complexa rede de negociação, os quilombos abolicionistas existiram em diversos lugares, a exemplo do Quilombo do Cupim, no Recife (PE), do Quilombo Carlos Lacerda, em Campos (RJ), e do Quilombo do Jabaquara, em Santos (SP). Essa tática revela a fundamental importância da agência de escravizados, libertos e livres negros na luta pela Abolição.
Sem a "avalanche negra", a fuga em massa, o projeto pela liberdade não teria obtido êxito.
FONTE:
SILVA, Eduardo. As camélias do Leblon e a abolição da escravatura: uma investigação de história cultural. São Paulo: Companhia das Letras, 2003.
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BRITO, Jailton Lima. A Abolição na Bahia, uma história política – 1870-1888. 1996. 265 f. Dissertação (Mestrado em História) – Faculdade de Filosofia e Ciências Humanas, Universidade Federal da Bahia, Salvador, 1996.
SONTAG, Ricardo. "Código negro"?: o regime jurídico excepcional de controle dos escravos no Brasil (1830-1888) [livro eletrônico]. São Paulo: Editora Dialética, 2024.
SILVA, Eduardo. As camélias do Leblon e a abolição da escravatura: uma investigação de história cultural. São Paulo: Companhia das Letras, 2003.
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