1835
MEDO, REVOLTA E PUNIÇÃO EXEMPLAR

A GUERRA DOS PALMARES, ÓLEO DE MANUEL VÍTOR, 1955
Desde 1830, o Código Criminal do Império já estipulava penas para o crime de insurreição, considerando a gravidade do caso, o status de liberdade ou escravidão dos participantes, bem como seus respectivos papéis no episódio. A insurreição era definida como a tomada violenta da liberdade, e a legislação visava atender as expectativas de quem tinha o medo das revoltas. A Lei de 10 de junho de 1835 reforçou essas disposições, reafirmando a pena de morte para homicídios e lesões graves cometidas por escravizados contra escravistas e feitores. A pessoa escravizada acusada era submetida a um rigoroso processo, sem qualquer consideração sobre o grau de culpabilidade. O julgamento era conduzido pelo juiz do termo mais próximo, e da sentença condenatória não cabia recurso.
Embora a proposta de 1833 (projeto de lei antecedente à lei de 1835) previsse castigos sem recurso, na presença de outros escravizados, essa cláusula não foi incluída na versão final da lei, mas a ausência de recurso à sentença de morte permaneceu. A urgência punitiva desta lei é compreendida pela influência da Revolta das Carrancas (1832) e da Revolta dos Malês (1835), tendo como objetivo principal reforçar o controle social e disciplinar da população escravizada, a fim de evitar novas rebeliões. Portanto, a existência de leis tão cruéis evidencia não apenas a resistência tenaz das pessoas negras à escravidão, mas também a forma como o Direito foi instrumentalizado como ferramenta de opressão.
FONTE:
RIBEIRO, João Luiz. No meio das galinhas as baratas não tem razão: a Lei de 10 de junho de 1835 – os escravos e a pena de morte no Império do Brasil, 1822-1889. Rio de Janeiro: Renovar, 2004.
Resistências Radicais
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"É LEGÍTIMO O PROCEDIMENTO DO ESCRAVO, QUE MATA SEU SENHOR"

GOLPE POR GOLPE DE HENRY LOUIS STEPHENS, 1863
Cinquenta e quatro anos depois, a Lei de 10 de junho de 1835 despertou um importante debate na imprensa da Corte entre dois abolicionistas. O estopim para o embate foi o pedido de revisão de penas ordenada pelo imperador, que pretendia atender a alguns pedidos de clemência em comemoração ao primeiro aniversário da abolição, em 13 de maio de 1889. Porém, antes mesmo da concretização dessa medida, Rui Barbosa publicou uma nota em seu Diário de Notícias, em 27 de abril de 1889, militando a favor da manutenção das penas impostas aos libertos por estes terem atentado contra a vida dos escravistas e/ou familiares destes e/ou feitores.
Dois dias depois da publicação de Rui Barbosa, José do Patrocínio, na Cidade do Rio, defendeu a revisão das penas, baseando-se na violência e na ilegitimidade da escravidão que teria imposto aos penalizados a alternativa de reagirem para não serem mortos. Neste sentido, Patrocínio recorria à "sentença de Luiz Gama [seu amigo]: diante de Deus e da moral é legítimo o procedimento do escravo, que mata seu senhor". Nem todos os escravizados que apelaram ao perdão imperial foram agraciados e muitos ainda continuaram presos.
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ANDRADE, Marcos Ferreira de. Rebelião escrava no Sudeste do Império do Brasil: a revolta de Carrancas – Minas Gerais (1833). In: SIMPÓSIO NACIONAL DE HISTÓRIA, 26., 2011, São Paulo. Anais eletrônicos [...], São Paulo: ANPUH, 2011.
MALÊS. Direção: Antônio Pitanga. Produção: Flávio R. Tambellini, Carlos Diegues e Lázaro Ramos. Roteiro: Manuela Dias. Intérpretes: Camila Pitanga, Rocco Pitanga, Rodrigo dos Santos e outros. Brasil: Obá Cacauê Produções, Tambellini Filmes, Globo Filmes, Gangazumba Produções, RioFilme, 2024. 1 bobina cinematográfica (113 min.), son., color., 35 mm.
REIS, João José. Rebelião escrava no Brasil. A história do levante dos Malês em 1835. 2. ed. rev. e ampl. São Paulo: Companhia das Letras, 2003.
RIBEIRO, João Luiz. No meio das galinhas as baratas não tem razão: a Lei de 10 de junho de 1835 – os escravos e a pena de morte no Império do Brasil, 1822-1889. Rio de Janeiro: Renovar, 2004.
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